Entrevista com Negalê [Curadoria de Projetos de Design] #14
Publicado em 18/04/2024
Equipe Printi
Letícia França - ou Negalê, como prefere ser chamada - é natural de Ilhéus, Sul da Bahia, mas reside há alguns anos em Aracaju, onde pôde se encontrar e se entregar à arte, de forma totalmente espontânea e autodidata. Além de ter o olhar voltado para identidade e subjetividade negras, trabalha como diretora de fotografia e filmmaker, realizando algumas obras desde videoclipes, filmes de moda e, recentemente e em processo, curtas-metragens.
Conheça mais sobre Negalê e se inspire em suas obras com muita bagagem cultural - e autenticidade. <3
Printi: Como é sua relação com o universo artístico?
Letícia França: É onde me entrego. Desde o que faço, enquanto penso e produzo, até o que consumo. Sou apaixonada pelas possibilidades de transgressão que a arte, em suas diversas expressões, pode trazer. Acredito ainda que arte sem política é puramente fetiche estético.
P: Qual foi o estopim para se você se encantar pela fotografia?
LF: Das poucas lembranças que tenho da infância, muitas delas eu brincava com a câmera de meus pais. Inclusive ganhei uma câmera de brinquedo e foi um dos melhores presentes que já recebi. Quando adolescente eu amava fotografar coisas do cotidiano com o celular, já fazia a graduação em Ciências Sociais, quando alguém me deu um toque: “largue esse curso e vá fazer o que você tem talento e ama fazer. Vá fotografar!”. Desde então, comecei a enxergar em mim um projeto de artista. Fiz um curso de fotografia, trabalhei em um estúdio na praia, e só quando saí de lá pude experimentar de fato o que tinha em mim.
LF: Apesar de “distante”, as Ciências Sociais me ajudaram bastante: há um questionamento em tudo que olho e que faço, nada é algo somente estético. Perceber que poderia (re)contar histórias, promover questionamentos, enfim, violentar uma estrutura imposta com o poder da imagem me fez enxergar meu trabalho de outra forma: com mais afeto.
P: Quais são suas inspirações?
LF: São as histórias das pessoas que me rodeiam, e elas. É a cosmologia iorubá, que vem se apresentando cada vez mais em meus trabalhos, direta ou indiretamente. Fotógrafos como Luiza Rouseanny, Helen Salomão, Juh Almeida, Flávio Rebouças, artistas visuais como Breno Loeser e Larissa Vieira, cineastas como Luciana Oliveira, Everlane Moraes e Yuri Costa. Além da vivência na poesia, no hip-hop sergipano e no candomblé.
P: O que a fotografia representa para você?
LF: Resumidamente, possibilidades. E são várias! Inúmeras, infinitas. E isso traz também responsabilidades. A imagem não só existe, ela representa algo. Saber o que você quer e está representando é importante e muito delicado. Eu, por exemplo, vou pelo caminho da identidade afro-brasileira. E há muita estrada ainda pra seguir.
Enxergar poesia no ato mais banal, como numa luz que se deita sobre a cozinha no final da tarde.
P: Qual o impacto de uma foto na vida de alguém?
LF: Ela cria e reforça ideias, né? Uma foto pode ser capaz de evocar sentimentos já esquecidos, te levar pra lugares e tempos que você não viveu, te fazer pensar sobre algo que você nunca reparou ou julgava não ser daquele jeito, daquela forma. Do mesmo modo que ela pode só reforçar na manutenção de estereótipos, por exemplo. Depende de quem faz, como faz, e também de quem vê, como vê.
P: A pandemia teve alguma interferência no seu processo criativo como fotógrafa?
LF: Com certeza! Boas e ruins. Veio justamente num momento onde eu estava correndo, sabe? Com muita energia pra fazer e aprender mais e mais. Então a pandemia veio e quebrou minhas pernas. Foi um grande baque pra toda sociedade e para os artistas não foi diferente. Fiz, inclusive, uma série de autorretratos no início, registrando o cotidiano aqui em casa e as relações. O vazio, o medo, e ali no finzinho a esperança. Foi quando comecei a voltar a fotografar, aos poucos.
LF: Houve um momento que surgiu a possibilidade fazer shots on-line - uma espécie de ensaio via videochamada. Foi uma experiência muito boa, porém não teve muito alcance, por questões como conexão e o aparelho celular, por exemplo. Mas o que foi produzido foi bom, a interação, o processo foi bem leve e até engraçado. Direcionar alguém a fazer uma fotografia por videochamada rende bons momentos.
LF: Com essa pausa forçada que a pandemia trouxe, pude também fazer alguns cursos. Foi a melhor parte, inclusive. Tive a oportunidade de fazer um curso de Direção de Fotografia no Centro Afro-carioca de Cinema Zózimo Bulbul, por exemplo, e não consigo explicar como isso foi importante e forte para eu retomar os trabalhos. Voltar a estudar, participar de oficinas e masterclass - aulas com especialistas - foi o estímulo para voltar a olhar a vida.
LF: Depois disso, no final do ano fui convidada a expor uma série de 3 fotos da exposição Esú - A Boca do Mundo, na exposição coletiva Olhares Negros em Sergipe, no Corredor Cultural Wellington Santos. Com o apoio da Lei Aldir Blanc, logo menos sairá a exposição completa de A Boca do Mundo. Fotografei, também com o apoio da LAB, a exposição Santa-do-Pau-Oco, em parceria com a Negra Luz, onde exploramos o sincretismo religioso da Santa Bárbara e Iansã na manifestação cultural do Samba de Aboio, que acontece no povoado de Aguada em Carmópolis-SE, desde 1888, sendo uma tradição familiar. Ainda pela LAB, estou dirigindo um sonho: um documentário sobre o movimento hip-hop sergipano, que tem muito potencial e ensinamentos.
P: Qual a mensagem por trás do olhar da Letícia?
LF: Acredito que, em tudo, há sempre: “Olhe de novo. Com calma, dessa vez”. Passo a mensagem, mas deixo o questionamento.
LF: Quero ter outra experiência com a fotografia. Inclusive acho tudo a possibilidade de enquadrar uma arte minha! Uma referência é o Decora Printi, além do valores serem acessíveis, o processo é bem intuitivo e simples. Estou me organizando pra colocar algumas obras em formato físico o mais rápido possível.
Acesse @negale.ph para apreciar outras fotografias incríveis da Negalê. Aproveite para enquadrar sua experiência com o Decora Printi. ;)
Publicado em 18/04/2024