Dia Mundial do Livro: Entrevista com a ilustradora Isadora Zeferino [Curadoria de Projetos de Design] #24
Publicado em 18/04/2024
Equipe Printi
Em 23 de abril é comemorado o Dia Mundial do Livro e Direito de Autor. Sancionada pela Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) em sua XXVIII Conferência Geral no ano de 1995, o propósito da data é incentivar a leitura, homenagear os autores Inca Garcilaso de la Vega, Miguel de Cervantes e William Shakespeare, além de reforçar direitos legais que preservam esse ofício.
E celebrar a obra de arte que é um livro também é exaltar todo o trabalho que acontece durante o desenvolvimento de um exemplar e que possibilita a conexão entre leitor e leitura. Por isso, hoje você vai conhecer os bastidores da ilustração para livros em uma entrevista exclusiva com a ilustradora e artista de quadrinhos Isadora Zeferino.
Isadora Zeferino
Mais do que tudo, acredito que a leitura gera empatia. Nós somos muito pequenos para o mundo onde vivemos, tem muita coisa que nunca vamos ver, lugares que nunca vamos pisar e pensamentos que precisam de estímulo pra nos interessarem… Então a leitura e a contação de histórias criam novos horizontes no que a gente sente e se interessa.
Isadora Zeferino
Isadora Zeferino, 28 anos, nasceu e se criou na cidade do Rio de Janeiro - RJ. Dois anos de Biomedicina na UFRJ mais dois de Desenho Industrial na ESDI/UERJ construíram juntos a experiência de uma faculdade completa, embora não tenha vindo o diploma. Tais vivências foram o suficiente para Isa se tornar uma ilustradora freelancer que trabalha com muitas vertentes na adjacência do design, como editorial, arte para publicidade e quadrinhos. Não poderia ser diferente, essas competências variadas lhe trouxeram como clientes a Disney, Faber Castell, Riot Games, Nestlé entre outros.
A arte como bálsamo
Arte sempre foi como um colo onde a ilustradora podia buscar conforto, seja por que amava os personagens dos desenhos que assistia ou por que estava se perdendo dentro de um livro ou álbum de música. "Realmente acredito que é o bálsamo pros nossos momentos mais felizes e mais tristes, e um dos poucos lugares onde sinto que posso existir com leveza, seja criando minha arte ou consumindo arte, ou melhor ainda, criando arte de coisas que eu consumo e me vendo nessas peças", diz.
Desde muito jovem, Isa sempre gostou do ato de esquecer do mundo enquanto estava desenhando num papel. "Lembro que quando era criança, minha mãe falava que me dava uma folha e canetinha e quando via, eu estava conversando comigo mesma em voz alta sobre as histórias e ideias das coisas que tentava tirar da minha cabeça pra colocar nos traços e cores… Não sei se sempre foi uma coisa central na minha vida, até por que eu decidi me dedicar de verdade à arte como profissão um pouco mais tarde, mas sempre foi algo muito especial e divertido pra mim", relaciona.
Reflexos da criatividade
O que é a ilustração senão um dos reflexos que a criatividade pode nos oferecer? As ilimitadas interpretações dessa expressão tornou real a possibilidade de usar a voz que a Isa mais estima. "Mesmo que eu goste muito de escrever, de cantar, de tocar violão e outras coisas, não sou boa em nenhuma delas (risos) e faço por prazer, enquanto o desenho é algo em que eu não só me encontrei, como uma disciplina que eu quero ser desafiada, aprender e crescer...", descreve. "De fato a ilustração junta duas coisas que eu adoro: essa necessidade de resolver desafios e a criatividade. Talvez um caminho mais artístico e poético não me contemplasse por que eu preciso desse estímulo externo de empresas, produtos, público-alvo pra produzir no dia a dia", admite a artista.
Apesar de ser completamente apaixonada pela ilustração, o que antecedeu esse sentimento foi a felicidade em existir um jeito de desenhar e interpretar as coisas que era uma profissão viável. "Acho que o pontapé foi começar a seguir artistas que faziam isso da vida, eu já acompanhava alguns desde a época do DeviantArt, mas conforme foram passando os anos comecei a perceber que tinham pessoas que também eram da América Latina, mulheres da minha idade, gente acessível que falava muito sobre o dia a dia e que me fez pensar que talvez ilustrar como carreira fosse uma opção", conta Isa.
"A propósito, sou muito grata a esse movimento na internet que me apresentou pessoas especiais e generosas com seu tempo e conhecimento por que no fim das contas foi o que me fez ter coragem pra dar o grande salto", afirma.
O ato de ilustrar livros
A palavra ilustração vem de “iluminar" o texto, compondo essa experiência e dividindo uma interpretação do que aquelas palavras querem dizer, de passar a frente uma interpretação ou um sentimento… É muito interessante por que é um coro de vozes: a do texto e do ilustrador, e o leitor, ao consumir, junta sua própria voz na mistura.
Diferente da necessidade de outros segmentos em que a ilustração se insere, o processo de equilibrar artes e textos depende de muitos fatores. "No geral, é uma coisa muito interessante por que você tem essa responsabilidade enorme com o trabalho da pessoa que escreveu o livro, de criar uma peça que não só faça jus à esse texto mas que também atraia o público para dar uma chance para o título. É muito legal por que capas e estilos de ilustração diferentes podem desagradar/agradar e chamar públicos diferentes. Como é o processo de ilustrar livros? Eu me considero nova nisso, então mal posso esperar pra saber o que eu responderia pra essa pergunta daqui a 3, 5 anos", reflete o questionamento.
Por trás de um livro
Toda leitura é uma imersão em um universo, mas, o que pode existir para além de um livro? Só você é capaz de responder. "Eu venho de uma família enorme e eu e minha mãe sempre fomos as leitoras de casa, que do nada desapareciam e ficavam presas dentro de um livro o final de semana inteiro, e meu pai nunca entendeu isso… É difícil transpor uma experiência pessoal pra uma pessoa, mas eu acho que talvez por eu ter sido bem mais introvertida quando era novinha, eu sentia que esses livros me faziam ter experiências maravilhosas, diversas e seguras. Do conforto do meu sofá eu tinha o prazer de conhecer tantas pessoas, lugares e pensamentos, o que eu acredito que também pode acontecer com filmes, mas o fato de só ter palavras e sua mente torna as experiências muito mais intimistas", opina, trazendo memórias à tona.
Ilustradora & Artista de quadrinhos
De acordo com visão de uma grande ilustradora e artista de quadrinhos, nós vivemos uma cultura que se enxerga muito em peças de cultura pop e faz disso grande parte dos assuntos e personalidade. "Com essa linha de pensamento quero dizer que estar inspirada, pra mim, pela maior parte do tempo era ver algo que me fazia ficar presente e entretida, e isso pra todos os tipos de mídia. Bons exemplos são como eu fui doida por boybands, por certos animes, por franquias de cinema, e essas obsessões me levavam a passar muito tempo não só pensando em por que aquelas coisas me tocaram tão profundamente como também me sentir muito grata pela existência delas. Isso me trouxe muita vontade de pegar todos esses sentimentos fortes e fazer alguma coisa com eles: fanarts, fanfics, entre outras expressões de amor por uma mídia que te encanta e te muda", disserta sobre influências.
Sendo assim, a arte acaba não sendo somente o que te faz sentir. "Eu já chorei na frente de pinturas e já passei perrengue pra ver bandas que eu amava, mais do que minhas inspirações estéticas (que existem, mas eu não acho que sejam a coisa mais importante do meu trabalho). Esse sentimento e essa energia é o cerne do por quê eu crio, e, sem dúvidas, minha maior inspiração", assegura.
Por outro lado, quanto mais trabalha com ilustração, mais a Isa percebe que tem muitas das mesmas dificuldades e armadilhas de quaisquer outras profissões, incluindo o fato de que quando você é artista às vezes é difícil separar trabalho de quando se está consumindo arte. "Tem uma quebra de expectativa muito grande por que eu acho que a gente acaba realmente imaginando que vai ser só alegria, e aí vem a necessidade de planejamento, os clientes difíceis, se adaptar a um trabalho que você não quer muito fazer, ter que trabalhar por que você precisa pagar suas contas... A transição de hobby para ganha-pão é algo que traz muitas questões interessantes", reflete a ilustradora.
"Hoje reluto pra dizer que você tem que amar arte pra trabalhar com arte, por que até isso pode gerar algumas dificuldades, o que eu acho que se mantém verdade porém que você precisa criar um relacionamento equilibrado e realista com o seu trabalho", finaliza.
Publicado em 18/04/2024